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Avanço da desertificação no Brasil e o enfrentamento a partir dos saberes tradicionais

Avanço da desertificação no Brasil e o enfrentamento a partir dos saberes tradicionais 1

A convivência histórica com o semiárido e as ações agroecológicas como enfrentamento e adaptação às mudanças climáticas

“Nós somos Terra, somos Floresta, somos água, a nossa qualidade de vida é o reflexo da nossa relação com a natureza, se a tratamos bem ela retribui mas senão morre a floresta, a terra seca…”

Dessa forma inicia o vídeo de divulgação da campanha Terra Floresta Água – Movimento Nacional de Enfrentamento à Desertificação e à Seca, lançada pelo Departamento de Combate à Desertificação do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. O ano de 2024 demarca os 30 anos da criação da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (UNCCD), a qual foi gestada durante a Rio-92 e aprovada pela ONU em 17 de junho de 1994. A data passou a ser considerada o Dia Mundial de Combate à Seca e à Desertificação e evoca a necessidade de mudanças na relação com a natureza.

Para compreender melhor o tema conversamos com Alexandre Pires, biólogo e educador popular, diretor do Departamento de Combate à Desertificação do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), que tem à frente a ministra Marina Silva, e é vinculado à Secretaria Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável. De acordo com Alexandre, as terras degradadas em climas semiáridos apresentam uma menor disponibilidade hídrica, o que leva a processos de desertificação. O processo de desmatamento e de queimadas são vetores extremamente danosos ao solo e à biodiversidade e estão entre os principais causadores da degradação da terra. “A retirada da vegetação deixa o solo exposto ao vento, ao sol, à própria chuva, isso tudo vai degradando o solo ao longo do tempo”, destaca Pires. Ele ainda menciona que o uso intensivo de agrotóxicos e de água de forma irregular, além das práticas realizadas nos sistemas de agricultura em grande escala, em indústrias e em monocultivos acabam exaurindo a terra da sua fertilidade e da sua capacidade produtiva.

Ainda neste contexto, ele destaca que o agravamento climático, em função do uso intensivo de combustíveis fósseis está aumentando a temperatura do planeta e isso, associado ao processo de degradação da terra, tem mudado e ampliado essa área de semiaridez em todo o planeta.

 

Contexto e enfrentamento brasileiro à desertificação e seca

Em 2023 o Ministério do Meio Ambiente solicitou ao Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) dados atuais sobre as áreas suscetíveis à desertificação no Brasil. Segundo Alexandre, esses dados são baseados no índice definido pela própria convenção da ONU, que é o índice de aridez, o qual é feito a partir de um cálculo sobre a quantidade média de chuvas e a média de evapotranspiração, ou seja, o nível de água no ambiente é um definidor se o clima é árido, semiárido ou subúmido seco. São essas as três categorias que definem o índice de aridez e definem a suscetibilidade à desertificação. Alexandre ainda destaca que os dados mostram um crescimento da área de semiaridez sobre áreas de clima subúmido seco que representam cerca de 370 mil Km² em 18 anos com o surgimento de uma área de clima árido no norte da Bahia com o sul de Pernambuco, e de duas áreas de clima subúmido seco fora do território histórico do semiárido, no norte do estado do Rio de Janeiro e em áreas do Pantanal (MS). “Isso mostra que o contexto de aquecimento global está gerando um calor mais intenso e isso, associado aos outros processos de desmatamento, está deixando o ambiente mais seco, se você não tem umidade você também não tem um processo de recuperação da vegetação natural, ou ele é muito mais lento e vai gerando esse processo de suscetibilidade à desertificação”, ressalta Alexandre.

Com base nesses dados o Departamento de Combate à Desertificação do MMA está desenvolvendo um conjunto de ações para a retomada da ação política institucional neste contexto. O Diretor Alexandre mencionou três ações que estão sendo desenvolvidas, como a elaboração do 2º Plano de Ação Brasileiro no Combate à Desertificação, a partir da escuta em todos os estados semiáridos e nas regiões do Brasil com ciclos de seminários para ouvir a sociedade civil, movimentos sociais, povos e comunidades tradicionais, populações indígenas, governos locais, comunidade científica e iniciativa privada. A escuta se dá no sentido de elaborar um documento até final deste ano e apresentar ao Governo Federal, assim como utilizá-lo como instrumento de diálogo na conferência da ONU sobre terras e secas da COP16 que acontecerá em dezembro em Riad, na Arábia Saudita.

Uma segunda ação acontece no intuito de apoiar os estados do semiárido, que abrange o Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo, para que elaborem seus próprios planos para enfrentar a realidade de eventos climáticos extremos e mudanças climáticas. E, por fim, uma terceira ação está sendo realizada no âmbito da comunicação e educação, a partir da campanha já citada no início do texto, “Terra Floresta Água”, divulgando informações sobre as causas e consequências do processo de desertificação e das secas e quais são as alternativas de saída a partir das práticas e tecnologias sociais de quem conhece e convive historicamente com o semiárido.

A Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca estabeleceu um plano estratégico para o período de 2018 a 2030 para neutralizar a degradação da terra para que, além de recuperar e restaurar, fosse possível degradar menos do que se consegue recuperar. Porém, nem o governo Temer nem o governo Bolsonaro construíram as metas para o cumprimento da parte brasileira no acordo. Atualmente o Ministério do Meio Ambiente está trabalhando com cerca de cinco anos de atraso para definir as metas para o cumprimento do acordo.

 

A resposta já é conhecida

O processo de aquecimento global está alterando a dinâmica de chuvas, do clima, dos ecossistemas e dos ambientes, como menciona o biólogo Alexandre, que afirma que os eventos climáticos extremos, como as enchentes que seguem no Rio Grande do Sul, não estão isolados destas mudanças, que provocam seca em algumas regiões, como a última ocorrida na região norte em 2023 e no Pantanal atualmente, e o aumento no volume de chuvas a exemplo do RS. Muitas das ações de recuperação e restauração ambiental podem ser inspiradas por conhecimentos milenares, como dos povos indígenas, por exemplo. Alexandre, que também é educador popular, e trabalha com temas como direitos humanos e agroecologia, destaca que é preciso que os governos entendam que as experiência e práticas de convivência com o semiárido e as ações que promovem a agroecologia tem grande valor do ponto de vista de mitigação e da adaptação às mudanças climáticas. “Se a gente observar as organizações e movimentos sociais ambientalistas, as comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas, elas têm muito a ensinar para os governos”, destaca Alexandre. Ele ainda acrescenta que os governos se encontram reféns da agenda capitalista e do setor empresarial, para ele os saberes tradicionais precisam balizar as iniciativas do governo e a mudança se dará a partir da mobilização social. “Não tem como a gente fazer mudanças e transformações sem que a sociedade esteja suficientemente mobilizada e articulada para pressionar os governos e as instâncias parlamentares, de tomada de decisão, no que diz respeito à destinação de orçamento, aos processos legislativos, [que são] mecanismo legais de enfrentamento a esse contexto”, finaliza.

 

Por Julia Saggioratto, Assessoria de Comunicação Rede de Estudos Rurais.

 

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Informações sobre a Campanha:

Vídeo manifesto: https://www.youtube.com/watch?v=JYFcbTbjAMY

Conheça a página do Movimento Nacional de Enfrentamento à Desertificação e às Secas: https://www.gov.br/mma/pt-br/composicao/snpct/dcde/movimento-nacional-de-enfrentamento-a-desertificacao-e-as-secas

Instagram: https://www.instagram.com/reel/C8DHMblvSio/?igsh=bDN0ZWtrZWQ0OHds

 

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